domingo, 22 de janeiro de 2012

Deseducar o Corpo

“Nós humanos, para renascer, temos de esquecer – abandonar a casca velha para que a nova apareça -, as cascas vazias das cigarras presas aos troncos das árvores são um passado subterrâneo que teve de ser abandonado para que o ser voante nascesse. A educação é um processo de sucessivas demãos de tinta sobre o corpo: cascas. O esquecimento e a desaprendizagem são as sucessivas raspagens em busca do esquecido...
Álvaro de Campos, num lamento, disse que ele era o intervalo entre os desejos dele e aquilo que os desejos dos outros haviam feito dele. Será isso a educação? O processo pelo qual gerações mais velhas vão jogando as redes dos seus desejos, sob a forma de palavras, sobre as gerações mais novas? A educação vai cobrindo nossa pele com sucessivas camadas de tinta. É preciso que a tinta seja raspada para que o corpo ressuscite. Desaprender e esquecer é raspar a tinta. Raspando-se a tinta volta-se ao corpo tal como ele era antes de ser enfeitiçado pelas palavras.”
Rubem Alves em Variações sobre o prazer p. 55 e 56.

Tenho pensado em deseducar meu corpo,
Fazê-lo desaprender sobre dias, horários, posturas, regras...
Ao educar um corpo, nós o endurecemos, o adoecemos, e por fim o matamos.
Então, percebi que para mim é melhor que deseduque meu corpo,
A fim de que possa conquista-lo,
E então, em silêncio ouvir a sua voz,
Vibração que transgride esta ordem repressora de toda liberdade dos meus movimentos.
Já basta! Estou farta de tantas negativas,
Vou ensaiando meu sim desenrolando minha língua num gesto suave,
Ao mesmo tempo forte, agressivo!
Semelhante ao despir-se da amante que se oferece numa oferta apaixonada ao seu amado.

Um comentário:

Ligia disse...

Quando li esse fragmento de Rubens Alves pela 1ª vez fiquei bastante impactada, mas anos depois ao relê-lo junto com seus comentários, fico agora atônita ao perceber que tenho tantas camadas de tinta daquela época ainda. É difícil deixar a casca velha, porém mais difícil é saber o que se deve fazer e não fazê-lo.