terça-feira, 22 de setembro de 2009

Sobre seres humanos e máquinas

Rio, 26.10.2008



I
Quero poder mergulhar no silêncio...
Preciso mergulhar no silêncio de minh’alma e me encontrar...
Mergulhar no silêncio de minh’alma e descansar.
Depois de ser sacudida durante horas e dias por ritmos frenéticos e músicas nervosas, preciso do silêncio para me reconfigurar, para recarregar as baterias e me lembrar de que não sou uma máquina.
Seres humanos não são máquinas, mas a cada dia que passa, estamos mais desumanizados, isto é, mecanizados.
Seres humanos não são coisas que se usam e depois são descartadas porque se tornam inúteis, mas estamos cada vez mais banais, alienados de nossa própria essência.
A espécie humana está se degenerando, se auto-destruindo quando realiza incursões em que pensa atingir apenas o outro, e é ilusão pensar que isso não me inclui.
Escrever, pensar, sentir, emocionar-se, contemplar, dialogar (e não monologar) são armas para vencer tal degeneração, de resistir ser submerso pelo caos em que o ser o humano está.
Por isso, mergulho no silêncio de minha alma e descanso...
Antigamente eram chamados de heróis aqueles que realizavam atos foram do comum, tarefas extraordinárias ou feitos sobrenaturais.
Neste tempo, os heróis são aqueles que não se esqueceram de quem são: apenas seres humanos.


II
Desde crianças nos ensinam que devemos ser conformados, submissos, subservientes...
Não devemos perguntar, questionar, duvidar...
Desde pequenos nos ensinam que não devemos ser curiosos, humanos, apenas peças cumprindo sua função dentro de uma grande fábrica chamada sociedade.
Espera-se que as peças nunca tenham defeito e algumas atendem a essa expectativa. Existem as peças que logo começam a ranger, mas é só por um oleozinho e elas voltam ao “normal”.
E existem peças que já foram feitas para dar defeito, isso mesmo, foram feitas para dar defeito, pois não existe manutenção sem peças defeituosas. As peças defeituosas também têm sua função, elas explicam porque a fábrica não é um paraíso e a produção não é cem por cento. São os bodes expiatórios do sistema fabril
Existem peças que nunca se encaixam em lugar nenhum...
Pobres peças, inventadas, nomeadas, escolhidas, classificadas, para justificar o mau andamento da fábrica.
Desde pequenos aprendemos que cada peça tem seu lugar determinado, e que ao mesmo tempo ela pode ser o que quiser, idéia esta que é uma falácia, pois se cada peça pode ser o que ela quiser, como cada uma tem seu lugar determinado?
Aprendemos também que peças importantes e de valor são as que não rangem, nem dão defeito e se encaixam perfeitamente em seu lugar... Como ser uma peça de valor quando se é acondicionado em ambientes inadequados, de forma inadequada, de modo que a vida útil desta peça estará comprometida por conta da sua má conservação e inevitavelmente ela rangerá e dará defeito a curto ou médio prazo?
São peças que são classificadas como inúteis, mas são as que mais dão lucro para a fábrica.
Desde pequenos aprendemos que nada pode ameaçar o funcionamento desta máquina, desta grande fábrica chamada sociedade.
Por isso, não podemos perguntar, questionar, ser livres para expressar o que sinceramente pensamos. Estas pequenas atitudes já seriam suficientes para abalar esta grande estrutura.
Tenho consciência do quão poderosas são as influências sociais, mas luto para não ser uma peça descrita, classificada, nomeada pelo sistema para executar determinada função.
Existem outras possibilidades, eu sei que há, neste momento elas são mais produto da fé, ideais ou um sonho utópico, mas há poder para criar outros caminhos, uma outra identidade. A educação só cumpre sua missão quando é instrumento para revelar o que realmente somos e nos libertar para viver o que existe de melhor, nossa tão pretensa humanidade...

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